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O estranho caso de Dr. Jekyll e Mr. Hyde: Todo designer é artista, infelizmente.

  • Foto do escritor: Ivan Sasha Viana Stemler
    Ivan Sasha Viana Stemler
  • 22 de out.
  • 3 min de leitura
“O homem não é verdadeiramente um ser, mas dois.” — Robert Louis Stevenson. (PS: Às vezes os dois brigam pelo mouse.)
“O homem não é verdadeiramente um ser, mas dois.” — Robert Louis Stevenson. (PS: Às vezes os dois brigam pelo mouse.)

Outro dia, uma aluna — dessas que têm o mapa mental mais organizado que uma estação de trem no Japão — me disse, com uma seriedade quase comovente:


“Professor, talvez eu esteja me descobrindo como artista.”


Eu ri.

Não por deboche, mas por reconhecimento.

Porque o dia em que o designer descobre o artista é o mesmo dia em que ele percebe que o Photoshop não é o problema.

A verdadeira travada do sistema é interna.

O design, afinal, não é sobre apertar botão — é sobre pensar. E a ferramenta mais poderosa da Adobe ainda é a cabeça de quem usa o InDesign.


A maioria dos meus alunos chega achando que design é um cargo, um software ou um feed bonito pra mostrar no Behance.


Mas design é jeito de olhar o mundo — e a arte é o Mr. Hyde que o Dr. Jekyll tenta manter sob controle nas reuniões de pauta.

No fim, o artista não pede permissão e o designer, coitado, ainda acha que precisa de briefing.


E é aí que mora a graça: o artista cria pra descobrir, o designer cria pra resolver.

Mas, no fim, os dois tão tentando a mesma coisa — fazer sentido num mundo que não faz o menor.

A diferença é só o prazo e o tamanho da xícara de café (ou da lata de RedBull).


Eu vejo isso todo semestre.

Tem o aluno que se acha incapaz porque ainda não domina o Illustrator, e o outro que acha que dominar o Illustrator o torna um deus.

E eu fico ali no meio, com a sabedoria de quem já perdeu 14 arquivos por salvar em cima da versão errada, dizendo:


“Calma. Todo designer é artista. Por mais que o contrário nem sempre seja verdade (e nem precisa ser).”


Porque ser artista é se frustrar, é querer desistir, é olhar pra tela e achar que nada presta — e, mesmo assim, continuar.

É fazer e refazer e refazer de novo, até o caos começar a fazer algum sentido.

(E, spoiler: às vezes, ele nunca faz. Mas a gente continua mesmo assim.)


Tem dia que eles me perguntam:


“Mas professor, e se eu nunca for bom o bastante?”


E eu respondo:


“Ótimo. Significa que você entendeu.”


Ser designer — e artista — é conviver com a dúvida, com o erro, com a incerteza de tudo.

É não confiar nem em si mesmo, mas seguir criando mesmo assim.

É um ato de teimosia com verniz estético.


E pra ser sincero, a docência me fez perceber que a gente ensina menos design e mais coragem.

Coragem de mostrar trabalho, de ouvir crítica, de refazer, de errar, de continuar acreditando.

Coragem de olhar pro vazio da tela e pensar:

“Ok, vamos tentar de novo.”


Então, pra quem tá se descobrindo artista, designer ou só tentando entender onde diabos se encaixa nisso tudo, o recado é simples:


Não tenta se encaixar. F***-** o mercado, o mundo e o que eles dizem sobre a gente.


O mundo já tem gente demais tentando parecer perfeita — e a perfeição, no design, é a morte da ideia.


Todo designer é artista.

Só que uns ainda estão descobrindo.

Outros já desistiram.

E alguns — os mais perigosos — seguem brincando de bagunçar o mundo pra ver se ele finalmente aprende alguma coisa.


E, falando em coragem, parabéns pra minha aluna lá do início — amanhã ela faz 21 anos, coitada, e ainda acha que devia ter o mundo todo resolvido.

Eu conto ou vocês contam?


(Spoiler: ninguém sabe o que tá fazendo. E quem diz que sabe tá mentindo)


 
 
 

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