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Anti-Manual de Design Contemporâneo: A estética da sobrevivência

  • Foto do escritor: Ivan Sasha Viana Stemler
    Ivan Sasha Viana Stemler
  • 1 de nov.
  • 2 min de leitura

Nem todo mundo tem verba, Adobe Cloud e referência da Bienal de Veneza — e tá tudo bem.


O bar pra beber sem se preocupar em ficar com os 4 pneus arriados.
O bar pra beber sem se preocupar em ficar com os 4 pneus arriados.

O Brasil é feito no CorelDRAW 12, impresso na gráfica da esquina e colado com fita dupla-face no letreiro da loja de R$1,99.


E, sinceramente? Às vezes é ali que mora o design mais honesto que existe.


Tem o pintor letrista que escreve “Temos X-Salada” com mais convicção tipográfica que muito branding milionário.


Tem o sobrinho que fez o cardápio no Word, alinhou tudo no olho e acertou mais hierarquia visual que a agência de São Paulo que cobrou 80 mil num rebranding pra uma rede de açaiteria.


Tem o terceirizado no serviço público que apaga o brasão errado com a borracha do Paint e salva o país por mais um dia.


Essa é a estética da sobrevivência.

Um país inteiro tentando não travar o computador nem o destino.

Um povo que não teve tempo pra aprender “grid suíço”, mas sabe que um cartaz precisa caber na parede do boteco e ser legível do balcão até o freezer.


O design do improviso é o design mais sincero.

Ele não se esconde atrás de conceito mequetrefe, nem tenta parecer o que não é.

É funcional, direto, humano.

Feito por gente que nunca ouviu falar em design thinking, mas resolve o problema — e ainda te recebe com um bom dia na porta do salão de beleza do final da rua.


Enquanto o mercado idolatra o minimalismo escandinavo, o Brasil vive o maximalismo da gambiarra.

Nosso design vernacular é o verdadeiro design de impacto social: resolve, comunica e sobrevive.

E é bonito por isso.


Porque no fim, design é isso:

um cartaz de rifa, um banner de formatura, um letreiro com um nome errado (Bar-racharia é genial... pqp).

Tudo feito por quem não tem tempo pra ser cool — só pra fazer funcionar.


A estética da sobrevivência é o que sobra quando o glamour vai embora e fica só a necessidade.

E é nela que mora o país real, o design real, a beleza que o Behance não entende.


Então, antes de rir do cartaz torto ou do logo desalinhado, lembra:

alguém ficou até tarde tentando fazer aquilo funcionar.

E conseguiu. (E você, conseguiu?)


Talvez esse seja o verdadeiro design brasileiro:

o que nasce do caos, vive de improviso e, ainda assim, comunica.

O resto é só blábláblá com patrocínio e nome em inglês.


[Este é o texto 5, último, da série Anti-Manual de Design Contemporâneo.

Uma coleção de crônicas escritas entre café, cansaço e ironia — sobre o design possível, o humano e o improvisado.

Não é guia, nem lição. É só um lembrete de que o caos também projeta — e que a dúvida, às vezes, é o software mais honesto que a gente tem.]

 
 
 

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